No
século 19, houve uma epidemia de tuberculose nos EUA, ceifando inúmeras
vidas de forma rápida e devastadora. Chamada de ‘’Consumo’’ na época, a
doença não era plenamente conhecida, portanto os meios de tratamento
eram ineficazes.
Os
sintomas da doença eram fadiga, suores noturnos e tosse intensa
acompanhada por catarro branco ou até mesmo sangue. Em decorrência dos
sintomas, a pessoa ia perdendo suas forças e desvanecendo lentamente, o
que contribuiu para difusão de mitos em torno da doença.
Os
médicos orientavam aos afetados a descansar e exercitar-se ao ar livre.
O tratamento era tão ineficaz que o número de mortes era imenso,
levando a vida de 80% das pessoas que contraíam a doença de forma ativa.
A Família Brown
Um
agricultor chamado George Brown talvez tenha sido uma das maiores
vítimas da tuberculose. Residindo em Exeter, Rhode Island, a família foi
responsável pelo pânico geral e pela difusão da história da existência
de vampiros (não eram chamados assim na época, mas eram associados com
figuras demoníacas e que sugavam a vida das pessoas). Em 1884, a esposa
de George, Mary Brown, foi a primeira da família a falecer por causa da
doença.
Em
1888, apenas quatro anos após a morte da mãe, a filha mais velha de
George, Mary Olive, morreu da mesma doença. Em 1890, Edwin, único filho
homem de George, também contraiu tuberculose. Um ano depois o estado de
Edwin piorou e seu pai decidiu envia-lo para as montanhas, em Colorado
Springs, onde o clima era melhor e a doença poderia ser curada pelo ar
puro e tratamento especializado.
A
viagem não funcionou e quando Edwin voltou a Exeter seu estado estava
ainda mais grave. No mesmo ano, Mercy Brown, filha mais nova, contraiu a
doença e também morreu.
Conto popular e a exumação dos corpos
Com
a morte de Mercy e o agravamento no quadro de Edwin, George Brown
decidiu recorrer a crendices e rituais da época, desesperado para salvar
o único filho restante. A superstição conta que de alguma forma, o
corpo de um dos membros da família estaria em bom estado mesmo depois de
morto, sendo possível encontrar sangue no seu coração. Tal
membro seria o responsável pelos constantes ataques da tuberculose em
diferentes membros da família, ceifando a vida de todos.
Caso
isso acontecesse,a pessoa seria considerada um vampiro, portanto, o
causador de todo o mal da família, já que este permaneceria vivo se
alimentando de seus familiares.
Em
março de 1892, George, alguns aldeões e um médico decidiram retirar os
caixões das covas e exumar os corpos de Mary Brown e Mary Olive. Era
inverno e houve dificuldade em cavar a terra congelada, mas os homens
foram valentes e abriram as covas da mãe e da filha.
Dentro delas, foi encontrado dois esqueletos decompostos devido ao tempo da morte.
Quando a tumba de Mercy Brown foi aberta, havia um corpo conservado, sem decomposição, após nove semanas da morte.
Foi
encontrado sangue no coração e no fígado de Mercy, o que foi suficiente
para causar pânico nos aldeões e em toda Exeter, afirmando que o
vampiro e causador de todas as mortes na família Brown era Mercy.
Algumas
fontes dizem que o corpo não estava na posição em que foi enterrado e
que houve crescimento nos cabelos e nas unhas do cadáver. Tal condição
não pode ser confirmada e poderia ser parte do folclore local, sendo
acrescentadas para causar mais impacto e medo nos cidadãos.
A
história da vampira Mercy Brown se espalhou como um vírus, surgindo
relatos de que moradores haviam visto a menina caminhando pelo cemitério
a noite.
Um artigo do jornal Boston Daily Globe de 1896, que tratava o medo de vampiros que surgiu após a história de Mercy.
Ritual
Descoberta
a causa da maldição dos Brown, um médico retirou o coração e o fígado
de Mercy. Os órgãos foram queimados até virarem cinzas.
O
ritual local indicava que para Edwin se livrar da doença, as cinzas dos
órgãos de Mercy deveriam ser misturadas em um chá. O filho deveria
consumir a bebida e seria o suficiente para se livrar da tuberculose.
O chá não curou Edwin e o garoto morreu dois meses depois, mostrando que a prática sobrenatural não tinha funcionado.
A razão para Mercy ser um vampiro
Analisado
posteriormente, foi declarado que o corpo de Mercy tinha sido
armazenado acima do solo em temperaturas congelantes, para que fosse
enterrada quando a terra descongelasse.
A
condição manteve o corpo intacto, como se este tivesse sido armazenado
em um freezer. Isso não explica o crescimento do cabelo e das unhas nem o
movimento do corpo dentro do caixão, mas tais acontecimentos não foram
confirmados, podendo ser parte das histórias e boatos de Exeter.
No
início do século 20, a tuberculose foi devidamente compreendida e
tratada, havendo melhorias na higiene e na nutrição das pessoas. A
ligação entre a doença e o vampirismo foi lentamente se dissipando, mas
Mercy Brown permanece na memória de todos.
O
cadáver foi enterrado em um cemitério local, sem fígado e sem coração, e
atraí turistas ao local, curiosos para conhecer a história da vampira.
Cultura popular
A
história da vampira de Exeter se espalhou com tamanha forma que
inspirou vários autores, como a escritora Caitlín R. Kiernan, em sua
história “So Runs the World Away”.
Grandes autores como Bram Stoker(Dracula) e
H.P. Lovecraft( The Call of Ctullhu) teriam tomado conhecimento da
história de Mercy por meio de jornais da época, o que serviu de
inspiração para histórias e personagens.
A
escritora Sarah L. Thomson também se inspirou na história dos Brown
para escrever seu romance adulto, de nome Mercy: O último vampiro de New
England. O podcast Lore também fez uso da história
de Mercy em seu primeiro episódio, tornando-se posteriormente uma série
de tv, que também contou em seu primeiro episódio a história da vampira.